Por Iolene Lima, educadora e membro da Associação Brasileira de Instituições Educacionais Evangélicas (ABIEE)

Ganha-se muito com a reforma do Ensino Médio; mesmo que tímida, é uma resposta à falência do sistema atual. Sua real implementação exige esforço nacional para tornar atrativo aos estudantes o currículo escolar, que faça sentido e diferença em suas vidas, que dê a eles o protagonismo do aprendizado e que consigam desenvolver e aprimorar seu projeto de vida. Esse é o grande destaque do Novo Ensino Médio.

Existe consenso entre gestores e educadores de que a reforma era necessária: há urgência em construir uma escola que permita conexões entre as unidades temáticas abordadas no processo de aprendizagem e a vida como ela é, que busque proporcionar uma formação integral e possibilite aos jovens um amplo leque de escolhas.

Por mais que na teoria essas mudanças contribuam para a formação dos estudantes, na prática é natural que surjam dúvidas para a efetivação do novo modelo, principalmente no cenário caótico em que nos encontramos.

Temos como lição de casa nas escolas confessionais efetivar a transição para o novo modelo, congregar e não fragmentar a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e itinerários, formar docentes e equipes, engajar estudantes e famílias e ainda inovar. Sim, em contexto de Novo Ensino Médio, inovação é fato! Colégios precisam observar, estudar tendências, mercado, possibilidades de novas carreiras e mergulhar no fantástico século XXI.

Colégios confessionais do país já vêm realizando a apropriação dos documentos regulatórios, investindo em capacitação para equipes e organizando escuta ativa dos estudantes, com comitês internos para planejamento e elaboração das novas propostas e formatos. Entretanto, as escolas tiveram pouco tempo hábil, pois foram pegas na avalanche provocada pela covid-19.

 

Percepções sobre a caminhada da BNCC: pesquisa com as instituições educacionais evangélicas

Resultados preliminares de pesquisa realizada pela ABIEE (Associação Brasileira de Instituições Educacionais Evangélicas), cerca de 63% das instituições pesquisadas disseram considerar implantada a BNCC na Educação Infantil e no Ensino Fundamental em 2019. Nelas, o currículo tinha sido reorganizado por competências e em sua quase totalidade, e contaram com apoio dos sistemas de ensino que utilizam como material/plataforma educacional, bem como das associações cristãs às quais pertencem. Algumas das escolas disseram conseguir estruturar seus currículos de acordo com o exigido, enquanto outras aproveitaram o ano para organizar um plano para implementar as mudanças necessárias, ou ainda aguardam maiores direcionamentos de seus sistemas estaduais. Os anos de 2020 e 2021 seriam, então, um período de experimentações e definições.

A mesma pesquisa revelou que em colégios que possuem Ensino Médio, cerca de 55,6% deixou a construção dos itinerários formativos para 2022, ou seja, estão em formulações e discussões internas principalmente a respeito da organização desses itinerários.

Uma grande preocupação do meio educacional é a ausência da matriz de referência do ENEM e como será feita a avaliação dos itinerários formativos. A não divulgação ou discussão aberta sobre isso, pelo INEP, tem causado incertezas. A falta de formação docente e das discussões acerca do Novo Ensino Médio também são itens apontados na pesquisa como de grande dificuldade no tocante à implementação das mudanças. Conforme visto no gráfico, 30% afirmam precisar de mais formação pedagógica e discussão sobre o tema e 26% apontam a má formação docente:

 

Como vimos acima, são diversos os questionamentos ou dificuldades que ainda ficam, tanto de natureza administrativa quanto pedagógica:

  1. Como será a formação docente inicial? Haverá mudança rápida nos currículos de licenciatura para o alinhamento entre conteúdo e desenvolvimento de competências?
  2. Como melhorar a formação docente durante o processo, ou seja, a famosa formação continuada, diante de um cenário de pandemia e crise financeira nas instituições privadas?
  3. Como organizar as avaliações dos alunos que percorrem trilhas diferentes dentro de um mesmo exame (ENEM)?
  4. Como realizar as parcerias para que sejam validadas para a contabilização da carga horária necessária, diante da ausência de regulamentações?
  5. Como viabilizar a escuta ativa dos alunos de forma não indicativa, ou sujeita a interferências diretas?

 

Os “comos”, as incertezas e a crise financeira causada pela pandemia fica expressa como maior desafio junto às instituições pesquisadas pela ABIEE:

Temos grande preocupação na boa formação docente, sem deixar que os conteúdos fiquem superficiais ou que os itinerários formativos sejam transformados em um “apêndice” da formação geral básica.

A flexibilização curricular deve garantir maior versatilidade às propostas pedagógicas das instituições, tecer uma construção de escola atrativa aos jovens, que dialogue com o mundo contemporâneo, validando a necessidade do trabalho com as competências socioemocionais e com o uso da tecnologia na sala de aula. Queremos, sim, indivíduos competentes, mas também autorreguladores de sua trajetória como aprendizes, autônomos e empáticos consigo mesmos e com as demais pessoas.

Essa construção de escuta ativa do jovem, considerando as questões socioemocionais envoltas nessa faixa etária e a ajuda na construção do projeto de vida do estudante, tem sido marco nas escolas confessionais. A BNCC veio ao encontro do que já era feito nesse ambiente: dar voz e protagonismo ao estudante! Os serviços de coordenação, orientação e capelania das escolas confessionais já atuam com os jovens na elaboração de um plano de vida, um projeto que agregue carreira e formação integral (caráter, honestidade, empatia, dentre outras virtudes tão necessárias ao ser humano). Trata-se de dar sentido à escolha de uma carreira, cujo alvo não pode ser apenas ganhar dinheiro. A questão é mais ampla: trata-se de discutir com os jovens o que é ser bem-sucedido de fato, quais são seus anseios e dúvidas.

 

Retomada da legislação e momento atual

É necessário estabelecer uma linha do tempo para entender que o processo de implementação do Novo Ensino Médio foi altamente impactado pela pandemia. Ele mal havia começado e já foi atingido pela crise. Em março de 2020, quando a pandemia do coronavírus começou a assolar o país, completávamos três anos da Lei 13.415/2017, um dos pilares regulatórios do Novo Ensino Médio, dois anos da Portaria nº 1432/2018, que estabelece os Referenciais Curriculares para a Elaboração dos Itinerários Formativos; e da própria BNCC do Ensino Médio, que foi assinada em dezembro de 2018.

Diante do panorama desafiador que se mantém em 2021, uma das principais tarefas no cenário educacional é garantir aprendizagem num contexto de incertezas das escolas – ora fechadas, ora abertas -, ensino remoto, híbrido e tantas nuances. Nesse contexto, todos estão: escolas confessionais ou não, públicas e privadas.

Quando a Lei 13.415/2017 aponta para a ampliação da oferta de diferentes trajetórias de formação para o estudante e a expansão da jornada escolar, evidencia que políticas públicas sejam colocadas em prática de forma equitativa. É inegável a discrepância de ofertas entre redes públicas e privadas. A grande maioria deescolas que ofertam o Ensino Médio na rede privada confessional brasileira já oferece uma carga horária ampliada, com diversos modelos em regime semi ou integral, oferecendo atividades extracurriculares aos estudantes.

 

Crédito: Shutterstock.com

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