Por Rhaisa Naiade Pael Farias, professora Assistente no Núcleo de Educação a Distância no UniCEUB e Pesquisadora Colaboradora Assistente junto ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade de Brasília.

A crise econômica, sanitária e humanitária que temos vivido reverbera na vida das crianças em dimensões distintas. No que tange às questões educativas, elas sofrem com a distância dos amigos, a ausência da professora, a limitação de espaços e a impossibilidade de frequentar a creche ou pré-escola. A família assume, então, uma responsabilidade a mais, a de mediar as atividades educativas enviadas pela professora durante o ano letivo. Portanto, precisamos assegurar o diálogo entre instituições educativas e famílias e esclarecê-las a respeito do papel da Educação Infantil (EI) para que elas não cobrem das professoras atividades não condizentes.

É preciso que as famílias saibam das particularidades da El e das diferenças com todas as outras etapas de ensino. Essas diferenças se refletem inclusive nas palavras usadas e na forma como falamos. Por exemplo, a EI não “prepara para o Ensino Fundamental (EF)”, e sim têm como foco o desenvolvimento integral da criança; lidamos com crianças e não “alunos”, já que este termo é usado àqueles que estão matriculados no Ensino Fundamental em diante; a professora não “dá aula”, e sim organiza tempos e espaços para o aprendizado e desenvolvimento da criança; o foco está nas experiências infantis e não em “conteúdos curriculares”. 

A EI é a primeira etapa da Educação Básica e tem como objetivo promover o desenvolvimento integral da criança em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social (Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996), é direito da criança, dever do Estado e opção da família (Constituição Federal, 1988). Esta etapa é  baseada no cuidar e educar, e as interações e a brincadeira são seus eixos estruturantes (Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, 2009).

Efetivamente é a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) da Educação Infantil que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais para as crianças, desde o nascimento até os 5 anos e 11 meses. Como essas orientações são recentes, cabe à instituição educativa e aos educadores também dialogarem sobre elas com as famílias. Pode ser interessante eles saberem, por exemplo, que a Base não traz conteúdos de ensino ligados à áreas do conhecimento, ela estabelece seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento: conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se. Sua estrutura está organizada em cinco campos de experiências (O eu, o outro e o nós; Corpo, gestos e movimentos; Traços, sons, cores e formas; Escuta, fala, pensamento e imaginação; e Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações) e estes garantem que os direitos de aprendizagem se concretizem. 

É possível que muitos responsáveis pelas crianças achem que elas devem ser alfabetizadas nesta etapa, pois têm como referência a escola que frequentaram e as atividades que realizaram quando pequenos. Porém, eles precisam ser lembrados que foram para a 1ª série do EF aos 7 anos de idade e que, desde 2009 com a Emenda Constitucional 59, as crianças precisam frequentar a pré-escola a partir de 4 anos, portanto, o trabalho desenvolvido com elas é essencialmente diferente.

Precisamos explicar aos responsáveis que a criança aprende nas relações com o outro e com os objetos, e a brincadeira é a atividade principal da infância.

Na brincadeira, a criança cria, recria, organiza pensamentos e se comporta para além de seu comportamento habitual, quando aprende e se desenvolve, explora o mundo e amplia a percepção sobre si e o outro. Nesse sentido, as atividades que as professoras da EI enviam para as crianças são brincadeiras e a família precisa brincar com os pequenos, ouvi-los e prestar atenção nas suas necessidades e anseios.

Outro ponto importante a ser evidenciado para as famílias é que as crianças são seres potentes, sujeitos de direitos, cidadãos, seres capazes que criam, interpretam e inventam, e a infância é uma categoria geracional diversa, histórica e socialmente construída, que varia a depender da região, da cultura e do tempo histórico. Por isso, as crianças têm valor em si mesmas no tempo presente e seus direitos precisam ser assegurados. Nosso compromisso precisa ser diariamente reafirmado e não podemos nunca perdê-las de vista. O futuro adulto que a criança será um dia não pode justificar práticas e decisões que desconsideram seus direitos e prioridades hoje.

A família sempre foi a principal parceira da instituição educativa, temos clareza ainda de que a educação é promovida e incentivada com a colaboração da sociedade. Porém, neste momento em que as instituições educativas estão fechadas, a família é a referência central que as crianças têm e sua importância cresce. Assim, é neste momento – e não depois – que devemos nos organizar para apoiar as famílias, trabalhar de maneira intersetorial em um diálogo com as áreas de saúde, educação, assistência social e direitos humanos. É preciso seguir com a sábia certeza de Paulo de Freire, que diz ser preciso esperançar, não como quem espera e não faz nada, mas como quem acredita, levanta-se e junto com os outros faz de outro modo.

 

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