Por Luiz Felipe Lins, professor de Matemática no Rio de Janeiro, eleito Educador do Ano no Prêmio Educador Nota 10 em 2020.

Sou professor de Matemática, atuo há 26 anos na rede pública e privada da cidade do Rio de Janeiro, em turmas de 6º ao 9º anos do ensino fundamental. Entendo que uma parte importante do trabalho do professor é fazer da sala de aula um local de aprendizagem e principalmente um espaço que possibilite mudanças na realidade dos alunos, um espaço que crie oportunidades de melhoria da qualidade de vida e que desenvolva o seu papel como cidadão. Promover uma educação significativa exige: planejamento, metodologia, avaliação e respeito às individualidades.

O planejamento de qualquer ação didática deve visar ao letramento matemático de forma a dialogar com as competências da BNCC, articular as diferentes unidades temáticas e alcançar o desenvolvimento das habilidades pretendidas.

A metodologia que tem marcado a minha prática de sala de aula é o ensino por meio de projetos. Acredito que dessa forma consigo transformar os alunos em protagonistas do seu próprio processo de aprendizagem, com propostas que favorecem a articulação da Matemática com a experiência de vida, já que traz significado à aprendizagem, proporciona o desenvolvimento do raciocínio lógico, a capacidade de comunicar, argumentar, representar, e favorece o estabelecimento de conjecturas na resolução de problemas. Esses são requisitos relevantes e consonantes com o que propõe a BNCC.

Alguns dos projetos que desenvolvi com os alunos permitiram uma variedade de temas e abordagens, e a exploração de diferentes competências e habilidades: Robótica, Matemática Financeira, Construção Civil e a conexão interdisciplinar entre a Geometria, Arte e História da Arte.

O projeto Geometria e Construção Civil, desenvolvido com alunos 7º ano, permitiu reconhecer que a Matemática é uma ciência humana que contribui para solucionar problemas científicos e tecnológicos e para alicerçar descobertas e construções, inclusive com impactos no mundo do trabalho, já que a conexão da Matemática com Arquitetura, Engenharia e a Contabilidade levou em conta suas condições sócio-cultural-econômica. Além disso, a relação que tiveram com pedreiros e ajudantes ajudou tanto os alunos a valorizarem esses profissionais que moram em suas comunidades como a perceberem a importância da Matemática em sua vida.

O desenvolvimento do raciocínio lógico, espírito de investigação e capacidade argumentativa fica explícito no percurso que é realizado desde quando vão à loja de material de construção para escolha do revestimento e do material necessário até as discussões em equipes do fator custo x qualidade. Desde o momento que mostrei o que era uma planta baixa e suas aplicabilidades, até a proposta da elaboração de uma casa planejada por eles em equipes, já havia planejado as habilidades trabalhadas, contidas nos eixos temáticos destacados na Base. Trabalhamos com as habilidades previstas no eixo Geometria e Grandezas e medidas, o conceito de escala, proporção, medida, proporcionalidade, a utilização de recursos tecnológicos, além da utilização de instrumentos de geometria.

Na elaboração de planilhas de custo, trabalhei habilidades propostas no eixo Estatística e Probabilidade e no cálculo para o revestimento do piso aproveitei para trabalhar as habilidades do eixo Álgebra, com a generalização do cálculo de áreas e perímetro de figuras planas. Mas nesse percurso, surgiu um imprevisto: a dificuldade de alguns em operar com os números racionais. Daí então as habilidades contidas no eixo Números e Operações foram retomadas.

Esse episódio ilustra algo muito importante: cada grupo tem suas especificidades e que no planejamento da elaboração de sequências didáticas deve-se contemplar a inter-relação entre esses eixos e entender que um precisa e utiliza o outro. Vale destacar que esses conteúdos foram tratados de forma articulada, e não isoladamente.

O projeto Geometria e Construção Civil visava desenvolver o espírito de trabalho em equipe, respeitando as habilidades individuais, e pretendia propiciar um ambiente de socialização de informações e de colaboração entre eles. Refletimos sobre o Projeto Minha Casa, Minha Vida para abordar a necessidade da construção de moradias populares financiadas pelo poder público, já que a grande maioria reside em imóveis sem documentação legal, corroborando com a competência global que busca desenvolver e/ou discutir projetos que abordem questões de urgência social com base em princípios éticos, democráticos, sustentáveis e solidários, valorizando a diversidade de opiniões, sem preconceitos de qualquer natureza.

O desenvolvimento de projetos permite que a avaliação vá muito além de instrumentos tradicionais, como testes e provas. Em cada uma das diversas etapas previstas no desenvolvimento do projeto, faz-se uma análise e reflexão dos resultados obtidos, a fim de validá-la ou não, para prosseguir com as outras etapas e ações. Índices de avaliações nacionais e internacionais mostram que o ensino da Matemática, no Brasil, não tem conseguido ter significado relevante na vida dos alunos.

O ensino baseado em projetos permite observar cada aluno a partir da sua individualidade. Cada aluno tem limites, tempos diferenciados de aprendizagens, angústias, motivações, história de vida e contextos sociais particulares. O exercício da escuta e uma atenção individualizada contribui para a construção de um ensino personalizado. Os projetos não são ações isoladas, são ações coletivas e colaborativas. Assim, cada aluno pode ser visto como um e como parte do todo. Cada aluno aprende com o outro e todos aprendem juntos.

O ensino a partir de projetos deve estar ancorado na realidade do aluno sem se limitar a ela, promovendo e estimulando a curiosidade. Certamente os estudantes valorizam mais os conhecimentos que sabem como usar, portanto é preciso ensinar olhando para a vida ao redor de nossos alunos e questionar a aplicação prática do que ensinamos a eles, tornando-os partícipes do processo ensino-aprendizagem.

A BNCC abre um espaço para refletirmos sobre nossa prática visando a regulamentar as diretrizes em toda a Educação Básica no Brasil, visando à equidade, com ênfase no desenvolvimento intelectual, social, físico, emocional e cultural do aluno. Esse processo de reflexão, eu acredito, contribui para que a educação mude a vida de milhões de crianças para melhor e conduza o Brasil para um avanço tecnológico para produzir bens de valor social para a população.

Fotos: Nidiacris Ribeiro-Trupe Filmes