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[Análise] Como a BNCC mudou minha prática como alfabetizadora

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*Por Mara Mansani, professora alfabetizadora.

Sou Mara Mansani, professora de escolas públicas no Estado de São Paulo, formadora de professores e colunista de educação, com foco na alfabetização.

São trinta e quatro anos de sala de aula, lecionando em diferentes segmentos, da Educação Infantil aos anos iniciais do Ensino Fundamental, além da EJA, a Educação de Jovens e Adultos. Esse é o tamanho da minha jornada na educação, sendo boa parte dela dedicada à alfabetização de crianças, jovens e adultos.

A minha primeira turma de alunos foi uma de pré-escola, na década de 1980, quando ainda era estudante do Magistério. De lá para cá, muita coisa mudou na educação! Perdi a conta de quantas turmas tive, de quantos alunos alfabetizei, de quantos projetos educacionais desenvolvi, de quantos desafios e dificuldades enfrentei, e principalmente de quantas mudanças e transformações presenciei na educação que impactaram diretamente meu trabalho em sala de aula.

Acredito que uma das mudanças mais significativas seja a implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), especialmente na alfabetização. Com a Base, veio também o debate, a possibilidade de participação e contribuição direta de professores em uma política pública, que foram convidados a refletir sobre a educação que estávamos fazendo, os questionamentos sobre qualidade, equidade, novas metodologias, aprendizagem significativa, entre outros temas. Nesse processo, chegamos à construção de novos currículos, o que demandou muito estudo por todos os profissionais envolvidos. Debatemos polêmicas e enfrentamos muitos desafios em sua implementação; em outras palavras, foi um “chacoalhão” na educação em nosso país.

Como professora, participei com minhas contribuições na construção da Base, no currículo Estadual de São Paulo e no currículo municipal de Salto de Pirapora/SP. Realmente foi uma oportunidade rara para professores, pois na maioria das vezes recebemos tudo já pronto, de “cima para baixo”.

Na minha opinião, um dos pontos mais importantes da BNCC foi indicar os caminhos a seguir. Não tínhamos muito claro o que precisávamos desenvolver com nossos alunos no processo de aprendizagem, nem de competências, objetos de conhecimento, habilidades etc. Não estava explícito de onde partir, chegar e até ultrapassar, em minha visão, especialmente na alfabetização.

E quantas mudanças notei em sala de aula: ficou mais evidente que as propostas devem ser marcadas pelo uso das diferentes linguagens que possibilitam práticas sociais. Afinal, se aprende a ler e escrever para o bem viver, sendo uma aprendizagem significativa para as crianças.

Um exemplo simples e prático que ilustra parte dessas mudanças no campo da vida cotidiana está na escrita de listas pelos alunos. Em vez de pedir que façam listas de palavras com a letra B, podemos propor textos de uso real, como listas de chamada, de compras, de convidados para um evento, de tarefas a fazer etc. Outro exemplo: no início da alfabetização, não é o mais apropriado começar com a leitura e a escrita de palavras somente iniciadas com vogais. Já o uso dos nomes próprios são um rico campo para essa aprendizagem inicial, como também a exploração dos diversos outros textos que fazem parte da vida.

Na BNCC, o texto é o ponto central para a definição dos caminhos nessa alfabetização e nem por isso ficam de fora outros aspectos também importantes ao processo de aprendizagem, como “diferenciar desenhos/grafismos (símbolos) de grafemas/letras (signos); desenvolver a capacidade de reconhecimento global de palavras, que será depois responsável pela fluência na leitura; construir o conhecimento do alfabeto;  perceber quais sons se deve representar na escrita e como; a relação entre fonemas e grafemas”; entre outros.

Dessa forma, ampliamos as possibilidades de situações de aprendizagens para a alfabetização. Com minha mediação, orientações e intervenções pedagógicas, os alunos produzem campanhas de conscientização com temáticas voltadas para crianças e famílias, escrevem textos instrucionais no formato de tutorais com apoio de fotos ou vídeos, escrevem suas próprias histórias, se expressam escrevendo poemas, têm acesso e leem textos de diferentes gêneros textuais, criam hipóteses de probabilidades em situações matemáticas, pensam e usam diferentes resoluções para os problemas, entre tantas outras aprendizagens que estão lá como habilidades previstas na BNCC, que orientam e fazem nosso currículo criar vida. A aprendizagem acontece de forma gradual, em uma progressão contínua, que se inicia por exemplo na leitura e ou escrita, de forma não convencional ou com o professor da turma como escriba, mas que depois vai se ampliando rumo à autonomia do aluno. Dessa forma, a alfabetização de maneira geral vai muito além do “codificar e decodificar”.

Durante a pandemia, com a educação remota no contexto familiar, foram nossos currículos que orientaram os caminhos do que podia ser desenvolvido nesse período, com a priorização das habilidades, novas metodologias e parceria com as famílias. Se fazer a educação na pandemia está sendo complexo, fico imaginando o que seria se ainda não tivéssemos a BNCC. Como professora, pude me preocupar e focar nas novas metodologias, nas adaptações, nas formas de conteúdos e orientações chegarem aos alunos.

Mas temos um grande caminho a seguir para dar mais qualidade na alfabetização das nossas crianças e para que todos aprendam. Para isso é preciso que a BNCC realmente chegue e esteja presente nos currículos em todas as redes e salas de aulas em nosso país, com formação dos professores, acesso de alunos e professores às tecnologias, entre outros direitos e necessidades!

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