Ensino Médio

[Análise] O que é preciso garantir para a implementação do Novo Ensino Médio

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Por Cecilia Motta, secretária de Educação do Mato Grosso do Sul e presidente do Consed

A reforma do Ensino Médio, institucionalizada pela Lei n. 13.415/2017, produziu profundas mudanças na forma de operacionalização dessa etapa de ensino em todo o país. De acordo com sua nova organização, consolidada pelas resoluções n. 02/2017, 03/2018 e 04/2018, do Conselho Nacional de Educação (CNE), os sistemas de ensino iniciaram o processo de revisão e/ou escrita dos documentos curriculares que irão orientar a implementação do Novo Ensino Médio nas instituições de ensino de sua jurisdição.

A escrita do currículo de referência do Novo Ensino Médio impôs muitos desafios aos sistemas de ensino, haja vista as novas características que essa etapa assumiu. Todavia, superado o momento de escrita, inicia-se o processo de sua implementação, que exigirá muito além de uma proposta pedagógica alinhada às diretrizes nacionais, mas toda uma organização e planejamento das ações a serem executadas.

O primeiro desafio é a lotação dos professores na nova distribuição de carga horária, tendo o teto de 1.800 horas para o desenvolvimento da formação geral básica, orientada pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), e o restante da carga horária para a implementação dos itinerários formativos, a serem organizados nas áreas de conhecimento e/ou na formação técnica e profissional. Independente do modelo de estrutura adotado para a matriz curricular, seja por disciplinas ou por áreas de conhecimento, observa-se que houve redução da carga horária que, tradicionalmente, era dedicada à formação geral básica do estudante, migrando do quantitativo mínimo de 2.400 horas para o máximo de 1.800 horas.

A lotação dos professores vai precisar de critérios específicos para garantir a atribuição de aulas, tanto da formação geral básica quanto de itinerário formativo, para que cada professor possa, minimamente, ser mantido na unidade de exercício que se encontra. Esse regramento para a lotação poderá ser normatizado por meio de ato próprio do dirigente máximo da instituição ou rede de ensino.

Outro desafio diz respeito aos sistemas de gestão de dados escolares utilizados pelas instituições de ensino para a organização das matrículas e a escrituração escolar. Com a implementação da flexibilização curricular, por meio dos itinerários formativos, em que o estudante fará a opção pela trajetória que lhe convém, é necessário estar atento ao tempo de realização da escolha pelo estudante e à forma como esta será registrada e monitorada.

Se o momento de escolha for no ato da matrícula, a escola deverá realizar todas as etapas de construção e divulgação dos itinerários, bem como de mobilização e seleção dos estudantes, quando necessário, antes do início do ano letivo. Isso poderá acarretar a constituição de turmas sem a garantia de existência de professores para ministrar os itinerários, pois a lotação só ocorre após a formação das salas.

Se a escolha dos itinerários pelo estudante ocorrer após o início das aulas, a escola deverá realizar, previamente, a composição das turmas e a lotação dos professores, bem como o ensalamento dos estudantes. A partir daí, será feita a divulgação dos itinerários, a mobilização e a seleção dos estudantes, quando necessário. Esse é um ponto de atenção, pois isso poderá acarretar a desarticulação dos itinerários ofertados com os interesses dos alunos, ocasionando grande movimentação na escola, seja pelo remanejamento de estudantes entre turmas e turnos, seja pela transferência para outras instituições.

Considerando todos esses pontos, o sistema de gestão de dados escolares da instituição ou rede de ensino deve ser ajustado para processar as diversas situações, especialmente em relação à forma como será registrada a vida e o avanço escolar dos estudantes no contexto da flexibilização. Ademais, as redes terão os desafios de constituir turmas em quantidades proporcionais por itinerário, para garantir a organização da escola e lotação dos professores, além de planejar e identificar ferramentas digitais para divulgação e escolha de itinerários pelos estudantes.

Também será necessário formalizar parcerias para a oferta do itinerário de formação técnica e profissional, com normativa do sistema para garantir a qualidade no atendimento do estudante, organizando a distribuição semanal de aulas para possibilitar sua execução, especialmente quando o estudante se deslocar para cursar o itinerário de educação profissional e tecnológica (EPT)  em outra instituição. As redes poderão ainda utilizar o percentual de aulas não presenciais para implementar o novo currículo no Ensino Médio noturno, bem como para o diurno, quando da dificuldade de organizar o transporte escolar.

Por fim, um desafio tão importante quanto os já elencados é o da formação continuada. Sem dúvidas, será preciso criar um programa de formação continuada dos professores para garantir o desenvolvimento do novo currículo, considerando níveis diferenciados nesse processo, como formação geral básica para todos, por etapas de ensino e/ou modalidades, e formação por área de conhecimento e/ou componente curricular.

A despeito da complexidade dos desafios, tudo o que temos feito até aqui é uma prova do poder de trabalho das equipes das nossas redes. Não temos dúvidas, que assim como escrevemos os currículos em plena pandemia, vamos avançar com sucesso na sua implementação e na formação dos professores.

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