A consciência socioambiental e o consumo responsável em âmbito local, regional e global são pautadas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) como competências que devem ir além do ensino de Ciências. Para apoiar os educadores a levarem o tema para a sala de aula, o Embaixador da BNCC Fabrício Cruz Florêncio da Silva, técnico da Secretaria Municipal de Santos, em São Paulo, responde quatro perguntas que ajudam a contextualizar o trabalho, ampliar as perspectivas sobre Educação ambiental e inspirar novas aulas. Nesta reportagem, você encontra a experiência de sua rede e a de Barcarena, no Pará.
Fabrício é professor há 16 anos, integra a Coordenadoria de Formação de Professores da Secretaria de Educação de Santos e é participante do Programa de Embaixadores da BNCC, do Movimento Pela Base, desde 2021. Confira abaixo a entrevista e anote as dicas para o seu planejamento.
Como a Educação ambiental aparece na BNCC?
Fabrício: Existem uma série de interpretações, mas, de forma geral, a Base vê Educação ambiental como transversal para todas as áreas, não como algo exclusivo das Ciências da Natureza. Na minha interpretação, temos elementos pulverizados nas Competências, mas também falta de forma mais clara como ela aparece efetivamente além das Ciências e Geografia e como podem acontecer as articulações entre as áreas. Vai muito da formação, da criatividade e da consciência do professor sobre esse tema.
Quais são os equívocos comuns no trabalho de Educação ambiental nas escolas?
Fabrício: Educação ambiental – até na concepção da Base – está ligada ao ambiente. Diferente do que geralmente se imagina, isso significa pensar além do ambiente natural porque o que é criado fora dele impacta o natural. A Educação ambiental está em tomar ações que são sustentáveis em todos os seus aspectos, até mesmo nas relações entre os humanos e entre estes e os demais seres vivos. Então, podemos pensar na alimentação, na locomoção e transporte, na ocupação dos espaços, na mudança da paisagem, nos materiais que escolhemos para usar na escola ou para reformar nossa casa. Tem uma profundidade neste tema que tem muito mais a ver com formação do indivíduo, de como ele entende o mundo, se posiciona e age em relação ao meio ambiente do que simplesmente trazer conhecimentos do ambiente natural para a escola. É muito maior do que isso.
Como os professores podem incorporar características locais no ensino desse tema em territórios em que o impacto do meio ambiente ou as características naturais podem não parecer tão presentes no dia a dia?
Fabrício: A gente mora na praia, mas tem coisas que não são tão óbvias e que podem ser exploradas independente de onde você more, como, por exemplo, o impacto do oceano inclusive para quem está no interior. Os elementos encontrados no oceano auxiliam na produção de materiais, de medicamentos e de alimentos, fatores que direta e indiretamente impactam a todos.
Ainda que eu esteja em um lugar em que eu não veja aqueles ecossistemas mais clássicos que estudamos preservados, podemos estar em um ecossistema que foi destruído para existir uma cidade. Precisamos que os alunos e os professores consigam estabelecer essas relações para olhar ao entorno e conseguir fazer conexões com o dia a dia. A dica é começar a olhar ao redor porque o entorno da escola possivelmente tem questões ambientais que podem ser trabalhadas. O lixo que as pessoas jogam que vai parar em um rio ou outra fonte de água e que vai parar no oceano, o trânsito, a questão da exploração do agronegócio ou dos minerais… e muitas outras atividades que precisam ser exploradas como um motivo para discutir educação ambiental nessa perspectiva de ampliar as conversas e pensar nos impactos para além do que está acontecendo no local.
Quais são as dicas que você dá para quem quer iniciar o trabalho nessa área?
Fabrício: Buscar a ampliação de repertório de olhar o tema para além da perspectiva ambiental, de pensar na relação com os humanos e com a natureza. Às vezes, os professores procuram olhar para o ecossistema preservado, mas você pode ter uma prática que está acontecendo no córrego do lado da escola e que pode trazer lições valiosas para sua turma. Escolha um exemplo que está mais próximo da sua região, do entorno da escola ou mesmo dentro dela.
Considero também que a investigação é um procedimento importante na Educação ambiental. Para construir atitudes, precisamos colocar as crianças em situações em que elas precisam lidar com aqueles sentimentos e com aquela ação. Uma boa dica é trabalhar com ações de monitoramento, em que os alunos também façam observação ao longo do tempo e possam explorar situações como: está chovendo a mesma quantidade sempre? Como podemos avaliar isso? O rio está subindo mais que o normal? Além de colocá-los em contato com as práticas de investigação, essas ações que acontecem mais a longo prazo vão criando um entendimento melhor da região e porque as coisas são como são e isso traz consciência ambiental para que ela seja preservada.
Se tratando de um conteúdo atitudinal, é preciso de seguidas repetições, reflexões e discussões. Não é aula expositiva que vai resolver porque atitude não se aprende com ninguém dando uma aula sobre como agir. As crianças aprendem vendo os adultos, então vale considerar também que mudar as atitudes das crianças demanda mudar as atitudes dos adultos. Existem muitas possibilidades se você parar para olhar ao redor e decidir colocar em prática.