Em outubro de 2022, há quase 1 ano, começamos a planejar o evento de celebração dos 10 anos do Movimento pela Base. Um marco tão grandioso merece um evento à altura e começamos a fazer brainstorm, ou – como preferimos falar aqui – toró de palpites: Vamos trazer especialistas internacionais? Vamos reunir e homenagear todas as pessoas que participaram do processo de construção da BNCC? Vamos fazer um seminário em um espaço cultural bem imponente em São Paulo? Vamos promover oficinas temáticas e trocas entre os maiores especialistas em educação do país? Todas essas ideias foram levantadas e algumas delas até estruturadas. Na verdade, gostaríamos de ter algo que contemplasse isso tudo, mas encontramos um desafio, tão comum ao terceiro setor: a restrição de orçamento. Os planos foram mudando e sendo adaptados à realidade. Até que chegamos a um consenso sobre o indicador de sucesso dessa entrega: independente do formato e recurso disponível, tinha que ser memorável e gostaríamos que as pessoas saíssem renovadas e inspiradas a continuar lutando pela educação pública de qualidade para todas as crianças e adolescentes do país. Eis, então, que uma pergunta chegou no nosso toró e não nos largou mais: que cara tem quando dá certo?

O que acontece quando a politica sai do papel, sai das mentes brilhantes de tantos especialistas técnicos, sai de Brasília e chega, de fato, à sala de aula?

Diante dessas provocações, o nosso evento não poderia ser de outra forma: ele tinha que ser no chão da escola. Mesmo que não tivesse internet, ar condicionado, que fosse em um lugar mais distante de Brasília e não tão imponente como um centro cultural na área mais nobre da cidade de São Paulo. A gente tinha que viver, por ao menos um dia, a BNCC na prática!

Então, saímos de diversos lugares do país (Rio Grande do Sul, Brasília, RJ, SP, Bahia, Rondônia, etc.) rumo ao Espirito Santo, estado que tem evidências consistentes da implementação da BNCC e Novo Ensino Médio e que também conta com uma Escola SESI de Referência. Chegando lá, vimos como a maior rede de ensino do país consegue colocar a infraestrutura a serviço do projeto pedagógico e como é possível formar professores e fazê-los formadores, para que promovam práticas alinhadas à BNCC, com grande destaque para as competências gerais.

Nosso aniversário é também uma oportunidade de reforçarmos nossos valores como instituição. Completamos 10 anos renovando nosso compromisso com a educação, trabalhando por uma aprendizagem mais significativa, mais conectada aos desafios do nosso tempo, que prepare para a vida e sociedade e para o mundo do trabalho, oferecendo mais protagonismo e perspectiva a crianças e jovens. Nosso propósito é trabalhar por aprendizagem com mais qualidade e equidade para todos e todas e acreditamos que a BNCC é o farol que aponta o caminho a seguir.

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Nos dividimos em quatro grupos e fomos para 4 escolas da rede estadual. Não ficamos apenas na capital ou em escolas da região central. A escola que visitei, por exemplo, fica em Serra, município mais populoso do estado. Fiz uma busca rápida no Google e 9 em 10 notícias mais recentes sobre a região se referem à criminalidade, violência e tráfico de drogas. Infelizmente, não vi nenhuma notícias sobre o trabalho incrível dos educadores da escola e da Secretaria de Educação. Então, relato aqui um pouco do vi.

Ao chegar na escola Clóvis Borges Miguel fomos recebidos pelos estudantes, que participaram da concepção e conduziram toda a experiência em sua escola para alguns dos maiores especialistas em educação do país. Eles mostraram seus projetos de vida e como estão se preparando para o futuro com um plano semanal para definir objetivos de curto prazo. Eles não pensam só na dimensão individual do sucesso: há uma prática coletiva na qual traçam objetivos para a turma, no médio prazo. Também vi como podemos ser antirracistas, valorizando e apresentando pessoas negras que são referências nas ciências, na literatura, na música e na política. Ah, eles também nos contaram a história da cidade deles, cenário de muita luta dos negros que resistiram à escravidão. Ainda teve espaço para ver reações químicas, códigos de programação, o funcionamento de um robô e a biblioteca, organizada, catalogada e com livros escolhidos por eles.

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O jovem quer se expressar, isso a gente sabe, né? E, na escola, os estudantes nos mostraram que podem fazer isso de diversas formas: pela música, pelo coral em Libras, pelas mídias digitais – a propósito, toda a visita foi registrada com vídeos e fotos pelos estudantes. Também percebi o anseio dos estudantes para dar espaço para o sentir: eles criaram um jardim sensorial e um jardim suspenso (esse da foto) que, além de ser usado para aplicar conhecimentos científicos, também é um refúgio para as leituras e momentos de relaxamento. Fechando a visita, quatro jovens apresentaram como planejaram e estruturaram um modelo de empresa de drinks, a partir do que aprenderam nas aulas do técnico em Administração, Biologia, Química, Língua Portuguesa, Inglês e Artes. Não posso deixar de mencionar que os drinks estavam lindos, refrescantes e uma delícia!

Em resumo, vi educadores engajados e estudantes protagonista que aprenderam, e sobretudo, nos ensinaram que é possível sonhar com um futuro diferente e ter esperança de ter uma educação pública de qualidade e com equidade para TODOS neste país. Chego ao fim dessa semana, ainda muito impactada com tudo que vi, senti e vivi, mas, sobretudo, chego com a sensação de que aquele indicador de sucesso foi cumprido: vimos a cara que tem quando dá certo e foi memorável!

Fabiane Pinto
Psicóloga e Coordenadora de Desenvolvimento Institucional do Movimento pela Base
Cria da escola pública que sonha (e trabalha!) pela garantia dos direitos de aprendizagem de todos os estudantes do Brasil.

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