Ensino Fundamental

“Volto para a sala de aula com a sensação de que muito ainda pode ser feito. É uma sensação maravilhosa!”

Boas práticas
Anna Flávia da Silva, educadora de Pernambuco

“Meu nome é Anna Flávia da Silva (foto acima), sou professora de língua portuguesa no município de Petrolina – Pernambuco. A cidade fica na divisa entre Pernambuco e Bahia, às margens do Rio São Francisco, no quente e ensolarado sertão pernambucano.

Faço parte do Programa de Desenvolvimento de Lideranças do Ensina Brasil, na turma de 2022. Leciono para três turmas do 6º ano na Escola Municipal Santa Terezinha, uma das maiores escolas da rede, em uma comunidade periférica de Petrolina.

Tenho a sorte de trabalhar com profissionais que entendem as complexidades dos alunos, a comunidade em que atuamos e os desafios da educação em geral. São profissionais que compreendem que ter uma visão contextualizada sobre a comunidade em que estamos inseridos é essencial para uma prática efetiva.

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Minha rotina com gestoras, coordenadores, equipe escolar e outros professores é permeada de reflexões e discussões, e de uma comunicação assertiva e afetuosa com alunos e suas famílias, sempre colocando essa comunidade em primeiro lugar.

Em 2023, nas  minhas férias, realizei um Trabalho com o Movimento Pela Base e pude conhecer diferentes realidades da educação. Foi importante ouvir participantes do Grupo de Embaixadores sobre cenários de todo o Brasil, suas potencialidades e dificuldades. Como professora e ativista por uma educação de qualidade, pensamos juntos em estratégias para alcançarmos esse objetivo.

No início do ano letivo, voltei para a sala de aula com muito aprendizado, novas estratégias e a sensação de que muito ainda pode ser feito. Esse ano, o projeto educacional da nossa escola fala sobre “protagonismo” e temos o compromisso de dar cada vez mais espaço para que os alunos desenvolvam suas habilidades e brilhem por si mesmos, com o apoio e o incentivo da comunidade escolar. 

Enquanto escrevo, estamos na primeira semana de aula, num processo de desenvolvimento de diagnósticos em todas as disciplinas. Nós, professores do departamento de língua portuguesa, temos como foco diagnosticar os níveis de leitura, escrita e interpretação de texto dos nossos alunos.

No primeiro dia, recebi os alunos com música, aproveitamos os primeiros momentos para conhecermos uns aos outros e fui surpreendida com alunos extremamente curiosos, participativos e barulhentos… E eu adorei!

Entender como lidar com o comportamento do 6º ano não é fácil. É essencial lembrarmos que eles estão num processo de mudança muito grande, que atinge basicamente tudo que constitui cada um desses estudantes como pessoas. Dentro da escola, muda bastante o que é esperado que eles desenvolvam entre o ensino Fundamental I (Anos Iniciais) e o Fundamental II (Anos Finais). 

Por isso, penso que é importante, antes de qualquer coisa, entender o que os alunos precisam, seja na escola, em casa ou na sua comunidade. Promover atividades que focam no contexto dos estudantes, que falem sobre as mudanças vividas, sobre o que virá e, principalmente, sobre o que eles podem fazer caso se sintam assolados pelas mudanças.

Na Santa Terezinha, temos horários diferentes de lanche, recreio, idas ao banheiro ou ao bebedouro para as turmas do 1º ao 5º ano e para os 6ºs, 7ºs, 8º’s e 9ºs.Na primeira semana já informamos aos alunos sobre os novos horários que eles devem seguir nesta adaptação ao Fundamental II. 

Para ajudar nesse processo de adaptação, optei por planejar três aulas para que o 6º ano entrevistasse os alunos do 7º ano sobre o ano letivo, o ambiente da escola, de sala de aula e as mudanças sociais que enfrentaram no ano anterior.

Na primeira aula, os alunos foram instruídos sobre como organizar um roteiro de entrevista, discutimos como seria a melhor maneira de abordar os entrevistados e, ao fim da aula, os estudantes escreveram suas perguntas e definiram como entrevistariam os alunos da turma veterana. 

Para o planejamento desse momento, utilizei a BNCC, em uma das competências gerais para o 6º ano: Argumentar com base em fatos, dados e informações confiáveis, para formular, negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns que respeitem e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental e o consumo responsável em âmbito local, regional e global, com posicionamento ético em relação ao cuidado de si mesmo, dos outros e do planeta.

Também abordei outras três habilidades específicas de Língua Portuguesa, que embora sejam avançadas para alunos recém saídos do 5º ano, voltarão ao meu planejamento em aulas seguintes para garantir que estão sendo bem aplicadas e que os alunos conseguirem compreender, aplicar e produzir segundo o que o currículo requer.

A habilidade “(EF67LP23) Respeitar os turnos de fala, na participação em conversações e em discussões ou atividades coletivas, na sala de aula e na escola e formular perguntas coerentes e adequadas em momentos oportunos em situações de aulas, apresentação oral, seminário etc.” foi aplicada para que os alunos compreendessem e desenvolvessem uma forma respeitosa de abordar os entrevistados e respeitassem as perguntas e os momentos de fala dos colegas.

Durante a entrevista, que foi realizada no estilo “entrevista coletiva”, muitos alunos curiosamente associaram o momento às entrevistas “pós-jogo” que acontecem após os jogos de futebol, e as perguntas, em alguns momentos seguiram o contexto do que eles conheciam sobre a prática: “Qual foi a maior dificuldade do seu 6º ano?” “Se você pudesse fazer alguma coisa diferente no ano passado, o que faria?” “Quem foi seu maior adversário do ano passado: as provas de matemática ou o time campeão da gincana interclasse?”.

Na segunda aula, após a entrevista aos alunos do 7º ano, discutimos as informações recolhidas pelos alunos e compartilhamos sobre os tópicos que mais apareceram nas respostas dos entrevistados, novamente seguindo uma habilidade específica da BNCC para Língua Portuguesa: (EF69LP14) “Formular perguntas e decompor, com a ajuda dos colegas e dos professores, tema/questão polêmica, explicações e ou argumentos relativos ao objeto de discussão para análise mais minuciosa e buscar em fontes diversas informações ou dados que permitam analisar partes da questão e compartilhá-los com a turma.”.

Nas aulas seguintes, iniciamos a construção dos Combinados da turma, uma espécie de “contrato didático” em que professor e alunos comprometem-se com o bem-estar da sala de aula, com regras básicas de convivência estipuladas e discutidas pelos estudantes. 

Para o planejamento desse momento, refleti sobre a habilidade (EF69LP13) “Engajar-se e contribuir com a busca de conclusões comuns relativas a problemas, temas ou questões polêmicas de interesse da turma e/ou de relevância social.” Nesse caso, usamos como fonte de informações a entrevista coletiva ao 7º ano, que deixou conselhos e a experiência vivida no anterior para que o 6º ano tivesse no que se basear.

Fico feliz em acompanhar o exercício da cidadania dos meus alunos. Observando, inclusive, o início de uma caminhada para alcançarmos a competência 10 da BNCC: “Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade, resiliência e determinação, tomando decisões com base em princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.”. Aos poucos, em atividades como essas percebo que eles vão se tornando protagonistas da escola e de suas próprias vidas. 

Mesmo tendo pouco recurso, partindo de uma realidade de extrema vulnerabilidade socioeconômica, fico cada vez mais alegre em perceber que os estudantes comprometem-se com a sociedade, seja na implementação de uma sala de aula mais justa e igualitária, seja desenvolvendo esses valores fora das paredes da escola.

Assim como no final das férias, volto dia após dia para a sala de aula com a sensação de que muito ainda pode ser feito, muitos objetivos podem ser alcançados, muitas habilidades podem ser adquiridas. É uma sensação maravilhosa!”

 

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